25 junho 2006

No divã

A OA anda deprimida. Não aparece em todos os serviços noticiosos, não suscita polémicas nos órgãos de comunicação. Mesmo correndo um sério risco de ser já o próximo bastonário, atrevo-me:

- A OA parece um 727 a voar sem piloto!

A OA não anda bem! Ora, como não tem amigos, sugiro que consulte um psicólogo. Só para a gente saber com o que conta, que Diabo! Aparentemente, o comportamento da OA não faz sentido. A um olhar menos atento, poder-se-ia pensar que as suas acções são comandadas pela maldade, pelo simples gosto de causar prejuízo. Mas tentemos contextualizar. Talvez seja possível criar alguma empatia com a OA.
O problema é que a OA não sabe acabar. Não é só acabar-se. Acabar os assuntos em geral.
Não saber terminar é muito frequente. Acontece a todos quando nos despedimos sete vezes antes de desligarmos a chamada.

- Então adeus! Beijinhos! Eu depois ligo-te! Ou dou-te um toque! Até logo! Beijinho! Tchautchautchautchaut!

Acontece a realizadores de cinema, perdidos em trilogias, e segundas partes, e continuações dos seus filmes. Ou quando prolongam o filme para além do fim da sua história. Como no Titanic, realizado por James Cameron. No final, passamos a odiar a simpática velhinha, sobrevivente da tragédia... E tudo e tudo. A velha nem dorme, nem salta do navio, nem atira a porcaria da jóia borda fora.
Acontece a escritores que não sabem como despedir-se das suas personagens. Não é tão fácil quanto alguns o fazem parecer.

- De modo que estás sem mulher...
Basílio teve um sorriso resignado. E, depois de um silêncio, dando um forte raspão no chão com a bengala:
- Que ferro! Podia ter trazido a Alphonsine!
E foram tomar xerez à Taverna Inglesa.
Eça de Queirós, O Primo Basílio

Acontece a ilustríssimos professores quando, por exemplo, tentam explicar a diferença entre omissões relevantes ou não, para efeitos de responsabilidade penal.

- Imaginem: vemos uma pessoa a afogar-se. Qual é a nossa responsabilidade se nada fizermos, se não lhe atirarmos uma bóia? E se não estava mais ninguém que pudesse atirar a bóia? E se atirarmos a bóia e, quando o sujeito está quase a agarrá-la, nós puxamos a bóia? E se a bóia estivesse mesmo ao seu alcance quando tiramos a bóia? Portanto, atiramos a bóia, puxamos a bóia, tiramos a bóia. Ou deixamos ficar a bóia. E estendemos a bóia, e voltamos a tirar a bóia. E agarramos a bóia.

Esta dificuldade em terminar tudo, na OA, tem diversas manifestações. Os senhores entendidos no assunto decidiram que eram necessários cinco anos para aprender o essencial sobre leis. Não mais. Não menos. Recentemente, outros senhores entendidos decidiram que, afinal, três bastariam. Não mais. Não menos.
Suponho (espero) que o plano curricular seja decidido de forma semelhante. Uma cadeira é essencial. Uma deve ser anual. Outra semestral. Não mais. Não menos. O Senhor Professor Doutor há-de ter um método semelhante para ocupar o seu tempo.

- 20 horas para estudar a evolução do instituto no direito romano, 4 horas para estudar a lei em vigor, 2, se houver tempo, para a proposta de lei que se prepara. Não mais. Não menos.

Depois de toda esta gente a ponderar, a estudar, vêm os Senhores da OA, com a sua argumentação característica, baralhar tudo.

- Ah, e tal! A gente esteve para aqui a pensar, e coiso! E se for como a gente pensa... A coisa... Portanto, entendemos que é melhor! E assim! Decidimos isto! E tudo e tudo!

Decidem que a faculdade não chegou. Decidem que os exames não chegaram. Só mais um. Como uma conversa que nunca acaba, como se ficasse sempre qualquer coisa por dizer. Ou perguntar.

- Qual o último dia do prazo?
- E qual o terceiro dia?
- E qual o quinto?
- E qual o décimo?
- Só mais uma, vá lá: qual o segundo?

A OA sabe que assim que for possível todos vão abandoná-la. E agarra-se enquanto pode a essa presença. É medo de estar só. É um querer companhia. É um querer ser amada. É um querer partilhar com os outros. É um querer iluminar a vida dos outros. Está sozinha. E fará o que puder para nos manter junto dela. Nem que tenha que inventar mais exames, mais aulas, mais intervenções, mais um ano de estágio.

Vejo-me triste, abandonada e só
Bem como um cão sem dono e que o procura,
Mais pobre e desprezada que Job
A caminhar na via da amargura!
Florbela Espanca, Livro de Soror Saudade

22 junho 2006

Dixit!

Sempre os poetas souberam cantar o amor platónico. Perdem-se de amores pela alvura da pele amada, pela delicadeza de movimentos, pela transparência do olhar. Um amor que não chega nunca a ser concretizado, tão mais perfeito quanto inacessível.
Ora, deve ser este amor que sinto também pela OA. É que só pode ser amor, esta enxurrada de sentimentos que me percorre quando penso nela.

Saí da faculdade à procura da minha primeira OA. Com vontade de agradar. Com desejo de ser aceite. Com disposição para fazer o que lhe for preciso.

Julga-me a gente toda por perdido,
Vendo-me tão entregue a meu cuidado,
Andar sempre dos homens apartado,
E dos tratos humanos esquecido.
Camões, Rimas

Não foi correspondida esta pressa. Não foi atendida esta urgência, que tudo quanto é bom tem que ser merecido. Mantive-me, pobre tolo, enganado enquanto pude. Não mostrou a OA qualquer interesse em mim, quis quebrar-me o entusiasmo. Não aceitou a responsabilidade de ser tão desejada. Manteve-se sempre a uma distância de segurança.
Ondas do mar de Vigo,
se vistes meu amigo!
E ai Deus, se verrá cedo!

Ondas do mar levado,
se vistes meu amado!E ai Deus,
se verrá cedo!

Se vistes meu amigo,
o por que eu sospiro!
E ai Deus, se verrá cedo!

Se vistes meu amado,
por que hei gran cuidado!
E ai Deus, se verrá cedo!
Martim Codax

E quando, por fim, se revela, se aproxima, dificulta a conquista. Não dá confiança. Que dê provas, que me esforce, que tente.

A minha vida é uma cena triste,
Dessas que se fazem numa praça
Por causa duma mulher...
Todos passam, todos olham
E sorriem da paixão...
Mas o namorado insiste:
- Minha Senhora, responda:
Sim ou não!
Sim ou não!
[...]
E o pobre pobre-diabo
Leva a mão ao coração
E diz:
- Minha Senhora,
Mate-me de uma vez...
Miguel Torga, O Outro Livro de Job

E depois de tanta hesitação, anos depois, o meu amor esmoreceu. O entusiasmo morreu. O desejo desapareceu. Quando a OA finalmente decidir, aceitar ou recusar-me, já não me importo. Estou cansado. Tenho que sair mais, conhecer outras OAs.

O dia em que eu nasci, moura e pereça,
Não o queira jamais o tempo dar,
Não torne mais ao mundo, e, se tornar,
Eclipse nesse passo o sol padeça.

A luz lhe falte, o sol se escureça,
Mostre o mundo sinais de se acabar,
Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar,
A mãe ao próprio filho não conheça.

As pessoas pasmadas, de ignorantes,
As lágrimas no rosto, a côr perdida,
Cuidem que o mundo se destruiu.

Ó gente temerosa, não te espantes,
Que este dia deitou ao mundo a vida
Mais desgraçada que jamais se viu!
Camões, Rimas

18 junho 2006

Capuchinho-Vermelho-Estagiário

Era uma vez, a avozinha OA, que estava só e doente na sua casa. Telefonou à sua filha, Faculdade de Direito, para que soubesse o que se passava.

- Ah, sabes, não é nada! Mas estou muito mal! Cof cof cof. Não, não te preocupes! Cof cof cof. E assim! É para saberes, minha rica filha! Cof cof cof. E cof.

A filha, em vez de ir visitá-la, como lhe competia, mandou o neto, o Capuchinho-Vermelho-Estagiário.

- Faz lá o almoço e leva-o ao raio da velha, que se não cala que está doente!

E o Capuchinho-Vermelho-Estagiário pegou no seu livro de receitas, e pôs-se a trabalhar.

Receita para cinco anos de curso. Servir quente, acompanhado por arroz branco e legumes vários, ou esparregado. Acompanhe com um Duas Quintas, 2002. Para sobremesa, um mestrado à escolha.
Ingredientes
- 1 Faculdade de Direito
- 500 caloiros
- 29 disciplinas
- Professores q.b.
- 450.000 € de propinas
- Livros q.b.
- 500 exames escritos
- Exames orais q.b.
Modo de preparação
Coloque as 29 disciplinas num recipiente. Junte professores q.b.. Misture tudo com cuidado até que cada professor tenha agarrado firmemente uma disciplina. Vá batendo de vez em quando. Não é necessário, mas dá alguma satisfação.
Pegue na faculdade de direito e faça um corte, de alto a baixo. Abra bem, sem partir. Coloque uma primeira camada de propina
s, forrando o interior da faculdade. Pegue em 100 caloiros, lave bem, e coloque na faculdade. Não se preocupe em escolhê-los. Ninguém o faz. Junte a cada caloiro um exame escrito. Ponha uma leve camada de propinas por cima. Repita o processo enquanto tiver caloiros. Deve guardar cerca de 1/3 de propinas para o final.
Quando tiver disposto todos os caloiros e as propinas em camadas, deite por cima a mistura de disciplinas e professores. Coloque devagar, deixando que escorra lentamente para os espaços que começam a abrir entre a
s propinas e os alunos. Espalhe uma fina camada ao longo de toda a faculdade. Por último, disponha o restante das propinas. Regue tudo com exames orais a seu gosto. Colocar no forno durante 20 ou 30 minutos. Enfeite com livros a seu gosto.

Quando tudo ficou pronto, meteu dentro de um canudo, e foi correndo mostrar à avozinha. Ignorou os olhares insinuantes do Lobo Mau e os piropos do Lenhador, e em breve estava entusiasmado à porta da avozinha OA.
A OA demorou a abrir a porta. Olhou enfadada para o Capuchinho-Vermelho-Estagiário, não ligou ao canudo.

- Tenho cá tantos desses! E tudo e tudo!

Desconfiou dele. Fez-lhe o teste de ADN, quis saber o nome dos pais, perguntou como se chamava o cão que tivera em pequeno, de que cor era o seu tecto da sala. A tudo o Capuchinho-Vermelho-Estagiário respondeu, já sem entusiasmo. Só porque a mãe Faculdade lhe dissera para o fazer.
Enquanto entra com a avozinha OA, finalmente, o Capuchinho-Vermelho-Estagiário já só pensa em fugir e entregar-se para adopção.

13 junho 2006

Uma bandeirinha também para nós!

Pergunto-me: como se calculam as vagas, em cada ano, nas faculdades? Será usado um critério de necessidade? Não será fácil determinar que, cinco anos depois, o mercado vai precisar mais 500 advogados. Ou mais 100 médicos. Ou 200 engenheiros. Será que se tem em conta a capacidade da faculdade? É fácil saber quantos meninos cabem dentro de um anfiteatro. Será que se contam os alunos que terminam o secundário? Sabe-se quantos são e metem-se dentro de umas quantas faculdades. Será que se conta o financiamento que a faculdade precisa? Divide-se o montante necessário pelo valor que o Senhor Ministro paga por cabeça, e aí está o número de lugares disponíveis.

Nas faculdades de Direito podemos saber quantos entram. Suponho que saibam quantos desistem. E quantos licenciados em Direito há?
Gostava de saber, a título de curiosidade, apenas, quantos somos. Não apenas os inscritos na OA: todos. Não sei se alguém sabe. Talvez seja como os funcionários públicos. Seria interessante reunir todos, noutro grande piquenicão, na Vasco da Gama. Ou no Estádio Nacional, na maior bandeira do mundo de licenciados.
Devíamos pedir à OA que organizasse uma contagem, um recenseamento. É possível conhecer os advogados que exercem em cada uma das comarcas, fazendo uma pesquisa no site da OA. Se quisermos saber quais são os advogados que têm as quotas em atraso, é bem mais fácil. A OA mantém uma lista actualizada com os nomes desses Senhores Doutores Advogados. Muito antes de os comerciantes publicitarem nas suas montras o nome dos caloteiros, muito antes do Cobrador do Fraque. Antes também, portanto, da discussão relativamente à tutela do direito à imagem e ao bom nome. Candeia que vão à frente, ilumina duas vezes. Ou, noutra versão, arde mais depressa. E extingue-se.

Ora, para ter a certeza de quantos somos, seria necessário contabilizar também os licenciados que não estão a exercer. Proponho que se faça um campanha de identificação de licenciados em direito. Colegas, vamos pôr uma bandeirinha à janela.
Compreendo que possa ser embaraçoso ser reconhecido nessa qualidade. E que haja algum receio. Nada de bom pode vir do facto de a OA saber a morada de cada um. Como as pragas do Egipto, as portas marcadas com sangue, para a morte não entrar para levar o primogénito. Diz a Bíblia.

E aconteceu que, no meio da noite, o SENHOR feriu todos os primogénitos na terra do Egipto, desde o primogénito do faraó, que havia de sentar-se no seu trono, até ao primogénito do prisioneiro, que está na prisão, e todos os primogénitos dos animais.
A Bíblia, Êxodo, I, 29

Ainda assim, apesar dos embaraços e riscos, vou pôr a minha bandeirinha à janela. Penso até que seria uma oportunidade para se aperfeiçoar o próximo Guia do Estudante do jornal Expresso, na parte em que refere as saídas profissionais do curso de Direito: vai o jornalista, de bandeirinha em bandeirinha, perguntando a ocupação de cada um. Os resultados permitirão actualizar a lista: desde ser operadora de caixa a advogado de sucesso.

11 junho 2006

Questão de método

Uma grande preocupação de todos os professores das faculdades de Direito é deixar bem claro, logo na primeira aula, porque devem todos assistir e aprender muito com a cadeira: é que aquela é a mais importante do curso. E perde-se a explicá-lo. Entusiasma-se. Agita-se.
É verdade: não conheço todos os professores, de todas as faculdades. De resto, querer conhecer todos os professores, atendendo ao número de faculdades, seria um projecto para o resto da vida. Como contar estrelas. E a minha mãe sempre me avisou quanto a isso.

- Não contes as estrelas que te crescem calos nas mãos.

Apesar disso, permito-me a conclusão. Considerem-na uma sinédoque, o tomar da parte pelo todo. Ou uma conclusão estatística: toda a minha amostra é assim, admitamos que todos são. Com uma margem de erro embora, que não saberia calcular.
O senhor professor doutor entra, com uma mão no bolso das calças, o sobretudo dobrado sobre o outro braço e um livro de sua autoria na mesma mão. Entra olhando o tecto, trepa para a sua cátedra, escolhe a cadeira ao centro e vai fingindo preparar-se. Os senhores doutores, assistentes, hoje, porque é o primeiro dia, entram em fila atrás do senhor professor doutor. Pisam o estrado receosos e orgulhosos, escolhem a cadeira o mais próximo possível do senhor professor doutor. E esperam que ele se sente.

Por esta altura estão os discípulos perdidos de riso da postura daquela equipa, comentam que o livro de sua autoria é uma colectânea de leis. Enquanto os alunos se não dispõem a ouvir, vão falando entre eles. Curvam-se uns para os outros, como se fosse segredo o que dizem. Acenam e sorriem uns para os outros, dão ares de importância a uma conversa trivial.

E diz o senhor professor doutor:
- Parece que as condições atmosféricas hoje estarão de feição à actividade piscatória. Pelo menos, até cerca das 10h13 ante meridiem.
E diz o senhor doutor, assistente, arrumando-se na cadeira e pondo um ar grave:
- Parece certo que assim é.
E diz o outro senhor doutor, também assistente, esticando-se todo da cadeira mais afastada:
- Pese embora, de acordo com a previsão da CNN, as condições se possam alterar antes, por volta das 10h09.
O senhor professor doutor assente com a cabeça e um sorriso pálido, já arrependido de ter acordado a ver Judging Amy, na SIC Mulher.

Quando o anfiteatro cria condições , o senhor professor doutor levanta-se, coloca a voz e discursa. Quem é ele, quem são os senhores à sua volta, o que é a cadeira, quais são os livros. E insiste na cadeira. Que é a mais importante do curso, que faz muita falta na vida prática, que é a base de outras disciplinas, que sem ela não faremos bem o curso, que não teremos bases para aprender outras matérias. Que tomemos atenção, que não faltemos, que estudemos muito. Ficamos avisados.

Na OA não acham importante nem necessário justificar o que quer que seja. É assim porque sim. É algo mais intuitivo, mais na base da confiança e da fé.

- Estamos aqui reunidos para juntar este jovem Estagiário à sua Sacrossanta OA.

Não há uma equipa. Está o senhor doutor, formador, sozinho em frente da sua turma. Não há livro de sua autoria. Vamos todos estudar os códigos. Outra vez. É uma espécie de faculdade. Mas em pequenino. Excepto na propina.
Nem passa pela cabeça ao formador justificar o que quer que seja. Alguém nos devia explicar porque vamos fazer outra vez a cadeira de processo civil. E processo penal.

- Eu passei na faculdade. Posso sair?

Em vez do discurso sobre a essencialidade das disciplinas, um cordial:

- Então doutores! Novidades!

É uma questão de método.

04 junho 2006

Bué à frente!

Li, num artigo de um jornal de referência, que o CDL é um exemplo de como as novas tecnologias de informação podem ser usadas para melhorar os serviços prestados.
Surgiram-me duas dúvidas.

Uma: que serviços presta o CDL?
O que saberá o tal jornal de referência que os Estagiários desconhecem?
A emissão da cédula profissional?
Eu também conheço uma gráfica, muito jeitosa, lá para os lados de Alfragide, que as faria. Iguaizinhas!
A realização de exames?
Inventaram a obrigatoriedade dos exames. Não compro um serviço, ao realizar o exame. Cumpro uma obrigação. Uma imposição.
A formação que prestam?
Apre! Eu não devia falar nisto.
- Advogado mais novo visita advogado mais velho!
Só frequento as aulas porque é obrigatório. Só assisto a acções de formação porque me obrigam. Vamos ver a assistência que têm essas acções, agora que não dão créditos.

Tanto quanto sei, um serviço é algo eu compro. Só compro o que preciso. Ou o que me dá gosto. Ou o que quero oferecer.

A propósito, gostaria de sugerir ao CDL a realização de uma campanha de marketing, para promover as acções de formação.
Cheque brinde acções de formação: o presente perfeito.
O lançamento seria acompanhado por uma intensa promoção nos media, com panfletos enviados aos pais do jovem Estagiário, seguidos de chamadas telefónicas para garantir que foram recebidos e saber se não haverá interesse na aquisição de um pacotinho de acções de formação. Ou de um lugar cativo. Na primeira fila, mesmo em frente ao projector do Senhor Doutor Advogado Formador. Em linguagem de marketing, parece que isto se chama fazer o fallow up.
E talvez até, deixo ao critério dos Senhores Doutores Advogados, um passo mais arrojado, com aquele senhor do impermeável verde, sem pescoço, em frente ao largo de Santa Bárbara.
- Falam, falam, falam, falam, falam, falam, e a gente não aprende nada! Fico chateado!

Retomando, não conheço os serviços que o CDL presta. Culpa minha, que me não informo.

Duas: porque não pode o Estagiário entregar todos os documentos, no final do estágio, pela internet?
Sendo o CDL um exemplo a seguir, surpreende-me que não tenham pensado nisso. Os modelos dos relatórios, consultas, requerimentos e afins estão disponíveis on-line. O Estagiário deve entregar todos os relatórios, consultas, requerimentos e afins em suporte digital. Existem acções de formação on-line. Porque se obriga o Estagiário a ir ao CDL? A faltar ao trabalho, qualquer que ele seja. A estar numa filinha, como quem espera no supermercado para pagar as comprinhas do mês. Que, por acaso, também se podem fazer on-line. Os supermercados são um exemplo a seguir no aproveitamento das novas tecnologias. Quem quer vender, actualiza-se. Como o CDL.

Se por acaso não podem ser entregues estes documentos on-line porque a Senhora da secretaria precisa conferir os papelitos, use-se o mail.
- Ó Senhor Doutor! Veja lá isto outra vez! Não vê que isto não está bem?! Corrija lá! Mande outra vez!

Se for por causa do chequezinho que o Estagiário deixa à saída, pode pedir-se que lhe enviem o comprovativo da transferência bancária.
(- Muito à frente...??!!)

Eu acho que há um motivo para obrigar os jovens estagiários a estarem em frente do CDL. Em frente, e à volta. Em fila indiana, com os seus fatos vestidos e a malinha em pele na mão. Diria que faz falta uma daquelas campainhas das lojas dos chineses

ding dong, ding dong

de cada vez que alguém entra.

Julgo que nos colocam todos em fila, pertinho uns dos outros - como quando colocam dez Estagiários no TIC, numa sala para cinco - por uma razão: para que tomemos consciência de quantos somos. É como se o CDL nos pusesse uma mão no ombro e abrisse a outra para a fila.
- Tu vê bem quantos são! Achas que te safas? Tu não queres desistir? Ainda estás em tempo!

Romance
(A voz de Satanás já nesse tempo
Era humana e natural...)
Miguel Torga, O Outro Livro de Job


O CDL, afinal, é um exemplo também da contenção com que devem ser usadas estas novas tecnologias. Valores mais altos se levantam, por vezes.